09 de maio de 2024

Câmara de Limeira celebra 15 anos da Lei Maria da Penha

Procuradoria Especial da Mulher realizou debate na última sexta-feira com participação de vereadoras, especialistas e representantes da Prefeitura de Limeira


Por Redacao 019 Agora Publicado 08/08/2021
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Câmara de Limeira celebra 15 anos da Lei Maria da Penha
Foto: Adriano Silva/Câmara Municipal de Limeira

Os 15 anos da Lei Maria da Penha foi tema de debate na Câmara Municipal de Limeira, organizado pela Procuradoria Especial da Mulher, nesta sexta-feira, 6 de agosto. Participaram do evento as vereadoras Mariana Calsa (PL), procuradora especial, que conduziu os trabalhos; Lu Bogo (PL), vice-presidente do Legislativo e primeira-procuradora adjunta; Terezinha da Santa Casa (PL), segunda-procuradora adjunta; Tatiane Lopes (Podemos), terceira-procuradora adjunta, e Isabelly Carvalho (PT), quarta-procuradora adjunta. 

Em nome do Poder Executivo, participou a vice-prefeita Erika Tank (PL), ex-vereadora e defensora de políticas públicas para a mulher. Também esteve presente a presidente do Fundo Social de Solidariedade, a primeira-dama Roberta Botion.

Compuseram ainda a mesa de debate a presidente do Centro de Promoção Social Municipal (Ceprosom), Maria Aucélia Damaceno, e o delegado titular da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), Danilo Broetto.

Representando o Legislativo, a vereadora Lu Bogo abriu o evento e ressaltou a retomada gradual das atividades presenciais na Câmara e deu boas vindas aos participantes.

A procuradora especial Mariana Calsa apresentou os últimos números sobre a violência no interior do Estado de São Paulo. De acordo com dados levantados pela Procuradoria Especial da Mulher junto à Secretaria de Segurança Pública, nos primeiros seis meses deste ano, 106 mulheres foram ameaçadas e 86 mulheres foram vítimas de lesão corporal, por dia. Houve um aumento também de 18% dos crimes de invasão domiciliar em relação ao primeiro semestre de 2020. 

O levantamento revela aumento da violência doméstica no primeiro semestre de 2021 comparado com o mesmo período do ano passado. “A violência ocorre pelo fato de que o agressor convive no mesmo ambiente que a vítima, e isso se acentuou com o isolamento social, que obrigou as pessoas a conviverem”, disse. “Isso acontece pelo simples fato de a mulher ser mulher, é a violência de gênero. E nós precisamos sim de ampliar os instrumentos de proteção e de combate a violência contra a mulher, por meio de políticas públicas efetivas, do município, do Estado e da União.”

O prefeito Mario Botion (PSD) fez uma participação no evento por meio de videoconferência. O mandatário elencou as políticas públicas municipais de defesa das mulheres, como o Botão do Pânico e a Patrulha Maria da Penha. “Gostaríamos muito que não existisse, e tomara que a sociedade possa avançar, mas, enquanto isso não acontece, precisamos de políticas públicas. Penso que a Lei Maria da Penha é algo muito importante para a vida das mulheres”, falou.

Debate

O delegado titular da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Limeira, Danilo Broetto, ao iniciar o debate, considerou que em Limeira não houve aumento considerável da violência, apesar do aumento nesses números no país. “Pelas estatísticas do ano passado é possível afirmar que, se houve um aumento, foi mínimo, mas nada exacerbado como em outras localidades”, expôs.

Ele estimou em cerca de 50% de mulheres que não fazem denúncia e, por isso, não geram estatística. “Um dos motivos é a convivência”, disse. Para esses casos, há vários mecanismos para preservar a integridade física da mulher, garantiu Broetto.

O delegado ressaltou que a lei busca proteger a mulher vítima de violência doméstica que foi agredida em decorrência da condição de mulher, ou seja, pela perspectiva de gênero. Ele ainda pontuou que há que se analisar questões como vulnerabilidade e hipossuficiência da vítima. “O agressor pensa que tem direito sobre a mulher”, explicou. Já os ambientes de violência, apontou, são a unidade doméstica, a unidade da família e a relação íntima de afeto.

Sobre as formas de violência, ele listou, conforme a lei: a violência física, a violência psicológica, a violência sexual, a violência patrimonial e a violência moral. “No entanto, há a possibilidade de se requerer uma medida protetiva, quando houver uma conduta que configure uma dessas formas de violência, sem que se constitua um tipo penal específico”, esclareceu.

Por fim, o especialista destacou a modernidade da lei em relação a outros países e levantou as novidades da legislação, como a criação do crime de descumprimento de medida protetiva e a impossibilidade de o delegado arbitrar fiança.

Em sequência ao debate, Maria Aucélia explicou os procedimentos de acolhimento às mulheres vítimas de violência doméstica pelo serviço social do município. Segundo ela, os profissionais traçam um plano de atendimento à vítima de violência, com destaque para o Programa de Aluguel Social e a Casa da Mulher como meios para que a vítima possa cuidar de si e dos filhos em segurança.

A presidente do Ceprosom ressaltou a importância da conscientização da sociedade, da criança ao idoso, para mudar comportamentos. “A violência traz cicatrizes que permanecem por muitos anos, cicatrizes físicas e cicatrizes emocionais.  O trabalho da Rede Elza Tank  tem foco na questão educativa, de proteger essa mulher hoje e proteger para ações futuras, para que esse ato de violência seja contido naquela família, não haja essa reprodução”, apontou.

Procuradoras

A vereadora Isabelly Carvalho fez um resgate histórico da luta das mulheres trans e travestis e falou sobre as diversidades e os pontos comuns da violência que afetam o gênero feminino. “Nós estamos aqui por um denominador comum, que é o fato de sermos mulheres e passíveis de violência. Mas, apesar desse denominador comum, reconhecemos que somos plurais. Além de sermos mulheres, somos heterosexuais, cisgêneras, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais, pretas, indígenas, brancas quilombolas, enfim, somos diversas”, enumerou. Ela apontou ainda as iniciativas legislativas e judiciárias para garantir, por meio da Lei Maria da Penha, as proteções às mulheres trans e travestis. Ela defendeu a mudança da lei para atingir esse público, pois nesses casos “ainda depende da sensibilidade e entendimento de quem está conduzindo o caso”.

Para a vereadora Tatiane Lopes, o debate sobre o assunto na Câmara Municipal é propício para o momento de pandemia. “Ainda que a lei seja um avanço, é notório que ainda temos um árduo caminho pela frente. E precisamos trilhar com muita responsabilidade e comprometimento para garantir que nenhuma mulher seja vítima de violência. Esse é o horizonte que vislumbramos e para o qual devemos caminhar”, defendeu. Ela fez uma relação à cultura da violência que atinge os animais e as mulheres. “A raiz que motiva a prática é a mesma”, resumiu.

Já a vereadora Terezinha da Santa Casa afirmou que o combate à violência deve ser uma bandeira de enfrentamento permanente e prestou solidariedade às mulheres que estão vivendo algum tipo de violência. “Podemos dizer a você, mulher, que ainda é submetida a algum tipo de agressão, saiba que você não está sozinha. Não tenha medo, denuncie o agressor. Você não está só, conte com todas essas mulheres que estão representando você também”.

Para a vereadora Lu Bogo, as mulheres têm muito a comemorar com o surgimento e desenvolvimento da lei protetiva. “A Lei Maria da Penha é um divisor de águas. Saímos do silêncio para apoio e busca de atendimento. A evolução não aconteceu do dia para a noite, foi a passos firmes com apoio de muitas mulheres que conseguimos chegar onde estamos”. Ela apontou, ao final, os instrumentos que a lei oferece e as atualizações da legislação. 

Canais de denúncias

O principal canal é a central telefônica 180, e a denúncia pode ser feita de forma anônima, que vai ser encaminhada para a delegacia da polícia mais próxima. Outros números também podem ser usados: 197 (Polícia Civil), 153 (Guarda Municipal/Patrulha Maria da Penha), 190 (Polícia Militar) e 181 (Disque denúncia da Polícia Civil). E há ainda a Campanha Sinal Vermelho, na qual a mulher desenha um ‘x’ na mão e apresenta em algum estabelecimento comercial, farmácias ou órgão público, como sinal de pedido de socorro.

A lei: do protocolo à sanção

Dois anos antes de entrar em vigor, a Lei Maria da Penha ingressou no Congresso Nacional como Projeto de Lei nº 4559/2004, de iniciativa do Poder Executivo, protocolado na Câmara dos Deputados em 3 de dezembro de 2004.

A proposição foi fruto do Grupo de Trabalho (GT) Interministerial, criado com a finalidade de elaborar proposta de medida legislativa para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. O GT foi integrado por diversos órgãos ligados às mulheres, aos direitos humanos e a ministérios. O Consórcio de Organizações Não-Governamentais Feministas também fez parte da construção, por meio de anteprojeto de lei para subsidiar as discussões do Grupo.

“A proposta foi amplamente discutida com representantes da sociedade civil e órgãos diretamente envolvidos na temática, tendo sido objeto de diversas oitivas, debates, seminários e oficinas”, relatou a então secretária Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire, na Exposição de Motivos encaminhada ao Congresso.

Em todas as comissões que tramitou na Câmara, o projeto foi relatado por mulheres parlamentares: Jandira Feghali (Seguridade Social e Família), Yeda Crusius (Finanças e Tributação) e Iriny Lopes (Constituição e Justiça e de Cidadania). No Senado, o projeto teve relatório elaborado na única comissão pela senadora Lucia Vânia (Constituição, Justiça e Cidadania). E foi direto ao Plenário em regime de urgência por iniciativa da senadora Serys Slhessarenko.  

O projeto foi aprovado no Plenário da Câmara em 22 de março de 2006 e, no Plenário do Senado Federal, em 4 de julho de 2006 (sob o título de Projeto de Lei da Câmara n° 37, de 2006). A proposição foi sancionada e transformada na Lei Ordinária 11.340/2006, com a publicação no Diário Oficial da União em 7 de agosto de 2006 , sem vetos, e assinada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a então ministra da Casa Civil Dilma Rousseff.

Maria da Penha 

A lei recebeu o nome de Maria da Penha porque, em abril de 2001, o Estado Brasileiro recebeu recomendações pelo tratamento dado ao caso de Maria da Penha Maia Fernandes. Ela sofreu tentativas de feminicídio, por tiros de arma de fogo e eletrochoque, o que a deixou paraplégica. Maria da Penha ficou conhecida por sua luta para que seu agressor fosse condenado. 

“Maria da Penha foi uma sobrevivente dos crimes e da violência doméstica. Foi um crime bárbaro, mas que demorou muito para que a Justiça se posicionasse, foi nesse momento que o Brasil foi denunciado por crime contra os direitos humanos”, explicou a vereadora Mariana Calsa. “Maria Penha saiu do anonimato e expôs para todos a sua história de vítima da violência doméstica. E a luta dela não foi em vão. Ela representa milhões de mulheres que disseram não, que disseram basta e procuraram ajuda. E essa ajuda só é possível quando as mulheres denunciam”, reforçou Lu Bogo.

De acordo com o relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA sobre este caso, o país não cumpriu o previsto em acordos internacionais e  recomendou o prosseguimento e intensificação do processo de reforma que evite a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra a mulher no Brasil. O documento também recomendou: “simplificar os procedimentos judiciais penais a fim de que possa ser reduzido o tempo processual, sem afetar os direitos e garantias do devido processo” e “o estabelecimento de formas alternativas às judiciais, rápidas e efetivas de solução de conflitos intrafamiliares, bem como de sensibilização com respeito à sua gravidade e às conseqüências penais que gera”.

A íntegra do evento por ser assistida pelo canal do Youtube ou do Facebook.