23 de junho de 2025

Estudos conectam vacina de Herpes Zoster a menor risco de Alzheimer

O neurocirurgião da Unicamp, Dr. Marcelo Valadares, comenta os achados, reforçando o entusiasmo e a necessidade de cautela para confirmações futuras.


Por Redacao 019 Agora Publicado 26/05/2025
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Estudos conectam vacina de Herpes Zoster a menor risco de Alzheimer
Resultados de pesquisas internacionais apontam para uma possível correlação entre a vacinação contra o herpes zoster e uma redução na incidência de demência, incluindo a Doença de Alzheimer

Uma promissora linha de pesquisa tem capturado a atenção da comunidade médica e científica global: a possível ligação entre a vacina contra o herpes zoster e uma menor incidência da Doença de Alzheimer e outras formas de demência. Embora os resultados sejam ainda preliminares, a consistência observada em diversos estudos ao redor do mundo gera otimismo para futuras estratégias de prevenção.

O herpes zoster, uma infecção causada pela reativação do vírus varicela-zoster (o mesmo da catapora), tem sido o foco de investigações que sugerem um efeito neuroprotetor de sua vacina.

Estudos conectam vacina de Herpes Zoster a menor risco de Alzheimer: Achados promissores e sua consistência global

Pesquisas recentes, realizadas em distintas populações e com metodologias variadas, têm revelado resultados notáveis:

  • Austrália: Um estudo observacional com mais de 100 mil participantes identificou uma redução de quase 30% no risco de demência entre os vacinados com Zostavax¹.
  • País de Gales: Análise de cerca de 280 mil indivíduos que receberam a vacina Zostavax mostrou uma redução de 20% no risco de demência.
  • Estados Unidos: Um estudo com mais de 100 mil participantes comparou imunizantes (Shingrix, Zostavax e outras vacinas), indicando uma diferença de até 17% na proteção contra demência³. Outro estudo norte-americano, em um universo de mais de 20.000 adultos, apontou que vacinados com Zostavax tinham 21% menos chance de desenvolver demência⁴.
  • Meta-análise Internacional (2024): Publicada na revista Brain and Behavior, reuniu dados de mais de 100 mil pacientes, estimando uma redução média de 16% no risco de demência entre os vacinados com Zostavax e Shingrix⁵.

A convergência desses resultados, apesar da natureza observacional dos estudos, fortalece a hipótese de um efeito protetor da vacina no cérebro. “Ainda não podemos afirmar que a vacina contra o herpes zoster previne diretamente a demência, mas os dados obtidos impressionam e dão esperança. O padrão observado merece atenção e aprofundamento ao longo dos próximos anos”, avalia o Dr. Marcelo Valadares, neurocirurgião funcional e pesquisador da Disciplina de Neurocirurgia na Unicamp.

Hipóteses para a associação: Como a vacina poderia proteger o cérebro?

Os cientistas investigam os mecanismos por trás dessa possível proteção, com algumas hipóteses principais:

  1. Prevenção da Reativação Viral e da Neuroinflamação: O vírus varicela-zoster pode permanecer latente no sistema nervoso e, ao reativar, causar inflamação crônica. A vacinação pode prevenir essa reativação, reduzindo processos inflamatórios que contribuem para doenças neurodegenerativas.
  2. Modulação Imunológica Ampliada (Imunidade Treinada): Vacinas como a Zostavax (com vírus vivos atenuados) podem estimular o sistema imunológico de forma mais abrangente, ensinando-o a responder de maneira mais eficaz a outras ameaças e inflamações associadas à neurodegeneração.
  3. Redução de Infecções e Complicações Secundárias: Ao prevenir o herpes zoster, a vacina também evita complicações neurológicas, como encefalites e neuralgias, que podem desencadear ou agravar o declínio cognitivo.

A importância da cautela e os próximos passos da pesquisa

Atualmente, a vacina contra o herpes zoster é recomendada para pessoas acima de 50 anos, visando prevenir as dolorosas complicações da doença. Se os efeitos neuroprotetores forem confirmados, seu uso poderá ser ampliado e impactar futuras diretrizes de saúde pública. No entanto, é fundamental manter a cautela.

“Estamos em um momento empolgante da pesquisa sobre doenças neurodegenerativas, com muitas descobertas em andamento. Mas é fundamental lembrar que correlação não é o mesmo que causa. Precisamos de estudos clínicos bem desenhados antes de transformar essas evidências em recomendações”, afirma o Dr. Valadares. “Se confirmada a correlação, podemos estar diante de uma medida de prevenção acessível e eficaz contra uma das doenças mais impactantes da atualidade”, conclui o neurocirurgião.

Prevenção e tratamento de demências: O que já se sabe

Enquanto as pesquisas avançam, a prevenção das demências continua a ser um foco essencial. Atualmente, a principal estratégia reside em escolhas diárias e hábitos saudáveis:

  • Estilo de Vida: Alimentação equilibrada, prática regular de exercícios físicos, sono adequado e estímulos cognitivos constantes.
  • Controle de Fatores de Risco: Monitoramento e tratamento de condições como hipertensão, diabetes e colesterol alto, que podem afetar a saúde cerebral.

Esses hábitos são cruciais para proteger o cérebro contra inflamações, problemas vasculares e perda de conexões neuronais. É importante ressaltar que, até o momento, não há cura para as demências.

Quando o quadro se instala, o tratamento visa retardar a progressão dos sintomas e preservar ao máximo a autonomia do paciente. Medicamentos específicos, terapias de neuromodulação e um acompanhamento multidisciplinar com neurologistas, psicólogos e cuidadores são fundamentais para melhorar a qualidade de vida. O apoio contínuo e empático aos familiares também desempenha um papel crucial no manejo da condição.

Referências:

¹ Pomirchy; JAMA, 23 de abril de 2025
² Eyting; Nature, abril de 2025
³ Taquet; Nature Medicine, julho de 2024
⁴ Estudo adicional, JAMA Network, 2025
⁵ Shah et al. Brain and Behavior, 2024

Sobre o Dr. Marcelo Valadares

Dr. Marcelo Valadares é médico neurocirurgião e pesquisador da Disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Sua principal área de atuação é a Neurocirurgia Funcional, com foco em cirurgias de neuromodulação cerebral para distúrbios do movimento, cirurgias menos invasivas de coluna (cirurgia endoscópica da coluna), além de procedimentos para dor na coluna, dor neurológica cerebral e outros tipos de dor.

O especialista é também fundador e diretor do Grupo de Tratamento de Dor de Campinas, que integra uma equipe multidisciplinar de médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos e educadores físicos.

No setor público, foi responsável por recriar a divisão de Neurocirurgia Funcional da Unicamp, onde iniciou a esperada cirurgia DBS (Deep Brain Stimulation – Estimulação Cerebral Profunda). Ele também estabeleceu linhas de pesquisa e abriu o Ambulatório de Atenção à Dor afiliado à Neurologia na instituição.